A evolução dos custos dos planos de saúde na primeira faixa etária e como isso afeta o acesso da sociedade à saúde suplementar

Sabemos que os custos na saúde suplementar são crescentes proporcionalmente à evolução da idade. Isso se deve a diversos fatores, entre eles o aumento da expectativa de vida acompanhado do prolongamento de tratamento de doenças crônicas com alto custo, seja por internações repetitivas e mais prolongadas, ou pelas terapias médicas, complementares ou medicamentosas.

Esse comportamento se comprova quando aferimos o custo médio per capita por idade, a partir da base de dados de usuários de planos de saúde das Operadoras atendidas pela Funcional:


Custo_médio_mensal_ por_idade_e_ano.

Demonstramos, também, a visão da evolução do custo por faixa etária, nos últimos 5 anos, conforme agrupamento de idades proposto pela ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar para definição dos preços dos planos de saúde:

Evolução do custo médio mensal por faixa etária e ano

 

O que mais chama atenção nessa representação gráfica é que, a partir de 2022, o custo da primeira faixa etária, que acomoda beneficiários de 0 a 18 anos, passou a ser superior ao custo das duas faixas etárias seguintes, de 19 a 23 anos e de 24 a 28 anos.

Para dimensionar o crescimento em cada faixa, traçamos o gráfico das variações de custo por faixa, a cada virada de ano. Nessa análise identificamos que em 2022 o custo médio mensal per capita dos beneficiários de 0 a 18 anos cresceu 43% em relação ao custo do ano anterior.

Variação do custo médio mensal por faixa etária e ano

As variações no ano de 2020 em relação ao ano de 2019 são negativas, como já se sabe, em razão da baixa demanda por serviços eletivos durante o período de pandemia. De 2020 para 2021 tivemos alta variação, similar em todas as faixas, com a retomada dos atendimentos após o período mais crítico da pandemia.

Mas é em 2022 que o custo da primeira faixa etária aumenta de forma muito mais expressiva que nas demais faixas, desfazendo a lógica de custos crescentes por faixa etária, que até então fundamentava a estrutura de preços dos planos de saúde. Se colocarmos uma lupa sobre essa faixa, é possível notar que as idades em que o custo mais destoou da séria histórica estão entre 3 e 6 anos, a partir do ano de 2022, se repetindo em 2023.


Variação do custo médio mensal por faixa etária e ano

Considerando todo o contexto da saúde suplementar nesses últimos anos, e outros estudos mais específicos já realizados pela Funcional, os quais podem ser acessados nos links disponíveis abaixo, é possível inferir que esse crescimento desordenado e inesperado está relacionado às mudanças regulatórias em relação ao fim dos limites das terapias anuais, liberdade de escolha do terapeuta em relação à qualquer método de tratamento para TEA, e judicialização dos casos que extrapolam a regulação vigente, por mais ampla que tenha se tornado.
 

https://www.prosperabr.com/opiniao/os-impactos-e-a-relevancia-do-autismo-no-mercado-de-saudesuplementar

https://www.prosperabr.com/opiniao/transtornos-globais-do-desenvolvimento-impacto-nos-custos-de-planosde-saude

https://www.prosperabr.com/opiniao/os-impactos-da-alteracao-do-processo-de-atualizacao-do-rol-decobertura-dos-planos-de-saude-e-o-fim-dos-limites-para-consulta-e-sessoes-de-terapias

 

Corrobora com essa interpretação o estudo apresentado pela ANS na audiência pública sobre TEA, em outubro de 2023, em que observou aumento significativo dos atendimentos a beneficiários de 0 a 15 anos em 2022 com psicólogos, terapeutas ocupacionais e fonoaudiólogos em relação ao ano de 2019 (referência de utilização esperada antes da pandemia).

https://www.gov.br/ans/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-da-sociedade/audienciaspublicas/audiencia-publica-36

Fato é que, com o crescimento do custo na primeira faixa etária, combinado com a regra normativa que prevê que o preço da faixa etária mais velha não pode ser inferior ao preço da faixa anterior, o plano de saúde tem se tornado mais caro para todas as idades.

Outro aspecto muito relevante, que corrobora com esse aumento do preço, é que, historicamente, a lógica da distribuição de preços por faixa etária consiste em redistribuir os carregamentos não assistenciais nas faixas mais jovens, onde o custo assistencial teoricamente é menor, e desonerar as faixas etárias mais velhas, cujo preço cobre basicamente o custo esperado. O carregamento não assistencial consiste na parcela do preço destinada a cobrir despesas administrativas, comerciais, entre outras não ligadas diretamente ao atendimento médico-hospitalar.

Essa redistribuição de receitas por faixa etária é o único mecanismo comercial que a Operadora possui para tornar o preço de determinadas faixas mais interessantes, uma vez que o preço deve cobrir no mínimo o custo assistencial esperado em cada faixa etária.

Entretanto, com o aumento do custo assistencial na primeira faixa etária, o que temos vivenciado na precificação é uma redistribuição dos carregamentos que deveriam incidir na primeira faixa etária sobre as demais faixas economicamente ativas, o que torna o preço do plano de saúde mais caro inclusive para a contratação empresarial, que representa a maior parte dos beneficiários da saúde suplementar.

O objetivo dessa análise não é responsabilizar um grupo de beneficiários pela sua necessidade de atendimento, mas refletir sobre como a expansão dos diretos de grupos específicos afeta o sistema como um todo, e sensibilizar o órgão regulador e o judiciário sobre a necessidade de aperfeiçoar as regras relacionadas a cobertura das terapias para portadores de TEA, a fim de evitar fraudes, desperdícios e privilégios que tem gerado desordem no sistema.

 

Equipe Funcional Health Tech

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